28 maio, 2005

Renda de Bilros: a arte na tradição

Percorremos as suas ruas estreitas, com casas baixas, onde os vestígios Manuelinos são particularmente visíveis nas suas janelas. Numa dessas ruas descobrimos a Casa do Vinhal. Solar urbano do século XVIII, a Casa do Vinhal é o Museu das Rendas de Bilros. A porta entreaberta aguça-nos a curiosidade. Fazemos soar a campainha e em instantes entramos no mundo dos Bilros.

Por: Maria Helena Oliveira

Através do tempo

Por entre as fotografias, que retratam a história das rendas, há uma que se destaca: a preto e branco, podemos ver mulheres e crianças a trabalharem em conjunto.

Desperta-nos interesse; “Porque estão todas ali?”. Manuela Silva, de 53 anos, funcionária do Museu, esclarece: «era uma oficina, onde eram pagas à tarefa, e como não havia onde deixar as crianças, acompanhavam as mães». E se, antes, todas as casas tinham uma almofada, o mesmo não acontece agora: apenas existem, em todo o conselho, 300 rendilheiras, «todas com idades avançadas», afirma Manuela Pereira, coordenadora das visitas dos serviços educativos.

A tradição foi-se perdendo e deixou de fazer sentido haver oficinas. Permanece no Museu a única que existe (à semelhança da escola das rendas). Maria da Guia, de 53 anos, rendilheira de profissão, é a coordenadora. A seu cargo tem a compra das rendas que serão comercializadas nas feiras anuais de artesanato.

«Paciência e criatividade» são os requisitos que considera fundamentais para se ser uma boa rendilheira. São, possivelmente, as causas da existência de dois tipos de rendas: as eruditas que têm desenhos mais elaborados, até com um fio mais fino; e as populares cujos desenhos têm formas geométricas.

Reconhecimento merecido

Numa tentativa de contrariar o esquecimento do artesanato nacional, a Câmara Municipal de Vila do Conde criou, em 1999, o projecto “Amor de Bilros... paixão de moda!”. Consiste numa aplicação prática das rendas de bilros na moda.

Desta forma, reúnem-se, anualmente, estilistas nacionais para trabalharem em conjunto com as rendilheiras, patrocinadas pela autarquia. O trabalho conjunto não se limita aos desfiles nacionais, mas também aos internacionais.

Paula Rola, estlista, participa no evento desde 1999, sendo a sua colecção presença assídua na Feira Internacional de Bilros, na Galiza. São muitos os estilistas consagrados que participam neste projecto. Em 2000, uma criadora de moda infantil, Lúcia Duarte, levou à passarela trabalhos realizados pelas crianças da escola do Museu das Rendas de Bilros.

Apesar de tudo, as crianças, que frequentam a escola do Museu, não pretendem ser rendilheiras: «vou continuar a fazer rendas, mas vou ter outra profissão» confidenciou-nos Teresinha, de 11 anos.

Para a posteridade

Num retiro silencioso, ergue-se a maior homenagem às rendilheiras de Vila do Conde. Na margem do rio Ave, junto ao Cais das Lavandeiras, eis a escultura que Ilídio Fontes criou, em Novembro de 1993, para homenagear estas mulheres.

Serena e dedicada, é assim que, dedilhando o bilro, a jovem de bronze, numa tentativa de enganar o tempo, vai criando as ‘obras de arte’ que permitem a esta cidade ser ainda o maior centro produtor de rendas de bilros.

Trazidas por marinheiros e comerciantes do Norte da Europa, a arte sofreu o seu primeiro revés com a lei de D. João V, que proibia o uso de qualquer tipo de rendas. Assim, as mulheres do Norte de Portugal, perante o cenário de pobreza que a aplicação do decreto previa, delegaram a Joana Maria de Jesus, rendilheira de Vila do Conde, a defesa dos seus interesses. Em resultado da sua persistência, quatro meses depois, a 19 de Setembro de 1749, El-rei mandou publicar um alvará que livrava as rendas da medida tomada.

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