28 maio, 2005

Português ou Ptgx?

Ciberlinguagem». Esta nova linguagem imediatista que engole as letras começou a mostrar-se especialmente aliciante para os jovens em idade escolar, dado que os estudantes rapidamente adoptaram o código virtual como forma corrente de comunicação escrita. É devido a esse facto que se coloca a dúvida: conseguirão os jovens separar a linguagem virtual da linguagem real?

Por: Leonora Gonçalves

De acordo com Mário Gonçalves, professor da Escola Secundária Gonçalves Zarco, em Matosinhos, «é pouco provável que a simplificação da ciberlinguagem contamine a norma culta». E acrescenta: «Os adolescentes sabem que a ciberlinguagem deve ficar restrita ao ambiente da rede. Não tenho observado um empobrecimento nos textos devido à disseminação do código linguístico utilizado na Internet», afirma.

O professor salienta ainda que, na sua opinião, «as abreviações, os signos visuais e a ausência de acentuação representam, simplesmente, uma forma de adaptação ao teclado». Para Mário Gonçalves, a grande barreira ao desenvolvimento da aprendizagem da língua ainda se explica pela falta de interesse pela cultura.

Já Rui Estrada, docente da Universidade Fernando Pessoa, tem uma opinião divergente. Para este, a linguagem virtual tem tido bastante influência na redacção dos alunos e acredita que isto constitui um verdadeiro problema. «Penso que hoje os alunos usam essa linguagem [virtual] desde cedo e, como a comunicação vai funcionando, eles pensam que não precisam de uma outra e isso é dramático depois, quando se chega a um nível de estudos avançado, quando têm de escrever uma carta para pedir um emprego, ou quando têm de fazer um texto formal de trabalho», alerta.

Este professor universitário, diz que a ciberlinguagem tem o seu lugar específico e não pode pôr em causa a norma culta da língua portuguesa. E conclui: «o que seria interessante é que os alunos dominassem simultaneamente ambas as linguagens,e não fazer do português uma linguagem de sms».

Também preocupado com o assunto, o psiquiatra de clínica privada, Luís Oliveira dos Santos, do Rio de Janeiro, comenta que a influência da ciberlinguagem pode ser especialmente prejudicial para as crianças. Luís dos Santos afirma que as crianças que frequentam ‘chat rooms’ podem estar a aprender a escrever incorrectamente em virtude da forma característica dos meios digitais. E vai mais longe: «há o risco destes jovens ficarem incapacitados de redigir segundo os códigos linguísticos formais».

Ao abordar os alunos observamos, também, opiniões dissonantes em relação ao tema. Rui Pereira, de 14 anos, estudante do Externato Lúmen, no Porto, é frequentador de ‘blogs’, ‘chat rooms’ e diz-se um «viciado» em SMS. Rui diz que precisa de ter atenção para não utilizar a linguagem abreviada na sala de aula: «‘mt’(muito), ‘tb’(também) e ‘ñ’(não) escapam-me às vezes», confessa.

Já Marilda Ferreira, de 13 anos, também do Externato Lúmen, diz não ter qualquer dificuldade em restringir o uso da ciberlinguagem apenas ao meio informático: «Como muitas das siglas da ‘Net’ são em inglês, não há forma de colocá-las num texto em português. Penso que isso é muito difícil de acontecer. A forma de escrever no telemóvel e na ‘Net’ não tem nada a ver com a escrita normal».

Autor do livro “Linguagem e a Internet”, o linguista inglês David Crystal não dramatiza a questão e classifica os defensores da sintaxe de “alarmistas”. Lembra que a invenção do telefone provocou a mesma desconfiança dos estudiosos.

Por incorporarem uma linguagem repleta de palavras herméticas, as pessoas corriam o risco de perder a capacidade de expressão e sociabilidade: “A nova tecnologia não está a sufocar a gramática, nem tampouco fere a cultura”, afirma. Para Crystal a criação de novos códigos linguísticos “só vem a enriquecer a nossa cultura e abrir uma nova dimensão para a escrita”.

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