28 janeiro, 2005

Comunidade Muçulmana no Porto: uma forma de vida

Em Portugal, o islamismo e o cristianismo convivem de forma civilizada e pacífica. Acreditam em profetas diferentes mas veneram o Deus Uno.

Por: Maria Helena Oliveira

Existem, em Portugal, cerca de quinze mil muçulmanos, espalhados pelo continente e ilhas. A comunidade muçulmana no Porto, embora pequena, conseguiu adaptar a sua cultura à realidade portuguesa. A maioria desses muçulmanos vem do norte de África. A mesquita, longe da sua arquitectura tradicional, é o seu local de culto e reflexão. O Corão é o seu livro sagrado.


Um rosto uma história

Numa loja de produtos oriundos de Marrocos e da Índia esconde-se Farhad Hossain, 28 anos, natural do Bangladesh. Apesar de estar em Portugal há quatro anos, a comunicação não é tarefa fácil. O português é ainda uma língua difícil de se falar. A dificuldade em pronunciar as palavras é clara.

Aceita falar da sua religião. Pede-nos, no entanto, para nos comunicarmos em inglês. Os seus dias são passados na loja, pois o shopping abre cedo e fecha tarde, exigindo-lhe uma presença diária.

Ao longo da conversa são evidentes as saudades do seu país de origem: «Tenho saudades dos meus pais, e vivemos de forma diferente a celebração do fim do Ramadão», conta. No Porto existem poucos muçulmanos, o que torna as celebrações diferentes. «Apenas rezamos de manhã, na mesquita, e fazemos uma ementa especial para o almoço. No meu país visitamos os amigos, decoramos as casas e à noite vemos televisão …existe uma programação especial para esse dia», explica.

Portugal sempre foi visto como um país acolhedor e hospitaleiro. Contudo, Farhad escolheu-o por outros motivos: as condições climatéricas fazem-no sentir em casa; o facto de ser pacífico dá-lhe tranquilidade. Conta-nos que, quase diariamente, um senhor, com alguma idade, vai até à sua loja para o questionar sobre o islamismo. Também os poucos amigos portugueses tentam compreender a sua religião e saber se é verdade o que se diz. Apesar de tudo, existem «semelhanças entre as duas religiões», confirma.

Farhad admite que existem muitos a deturpar as mensagens d’Al Corão. Na sua opinião, «os muçulmanos que matam, não o fazem por questões religiosas, pois a paz é a essência de todas as religiões». Há uma confusão idêntica com a forma como as mulheres são referidas: «Mohamed dá direitos iguais. Mas há quem não os queira seguir». Para o ano, Farhad planeia regressar ao seu país e casar.

A voz da oração

A pouca informação sobre a comunidade muçulmana no Porto complica-nos a chegada à mesquita. Percorremos algumas lojas. Olham-nos com alguma desconfiança e mostram-se reticentes quanto a localizar o templo. Indicam-nos a pessoa que nos pode dar a informação. Quando chegamos, ficam surpreendidos. Perguntam-nos se somos muçulmanas mas, apesar da desconfiança, conseguimos a informação.

Já na mesquita, ficamos sem perceber se estamos no lugar certo. Não existem quaisquer semelhanças com o templo que imaginávamos. Tocamos à campainha. Somos recebidos com um sorriso mas, mais uma vez, surgem os problemas de comunicação: não falam português nem inglês. Somos conduzidas a uma sala, onde ficamos à espera que alguém venha falar connosco.

Passado algum tempo, aparece o Sheir Amadu Camara, natural do Norte de África. Por entre a conversa, revela-nos que estudou a religião islâmica na Universidade da Mauritânia. A sua vinda para Portugal coincidiu com o fim da sua formação académica. Veio para Lisboa em 1991 e está há dois anos no Porto. Na mesquita dá aulas e faz as orações.

Sobre a comunidade muçulmana portuense, explica que a sua maioria é proveniente do «Norte de África, especialmente Magreb e Marrocos. Existem, também, alguns muçulmanos convertidos», afirma.

Não sabemos como abordar a inevitável questão do terrorismo, por isso questionámo-lo sobre Bin Laden. A sua resposta é clara: "Cada um paga pelo mal que faz. Após o 11 de Setembro ganhámos um novo nome: terroristas. Os ocidentais gostam de generalizar. Não é porque um muçulmano cometeu crimes que todos são iguais". No seu tom de voz fica bem expresso o desagrado pela opinião global sobre a sua religião. E conclui que muitos «deturpam o Corão».

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