26 junho, 2004

Temos o rio mais poluído da Europa

Todos conhecem o rio. Rio Ave. Um rio frio, escuro e sem fundo. Nestas águas, a vida que existe não está sequer visível. E a poluição não pára de aumentar. Este é apenas mais um sinal dos problemas que envolvem a preservação e gestão da água em Portugal.

Por: Ana Carina Pereira

O papel da ADAPTA Manuel Rodrigues da Silva, presidente da Associação para a Defesa do Ambiente e do Património (ADAPTA) na região da Trofa - constituída para defender o ambiente, o património natural e promover a qualidade de vida das populações - sonha com um rio de águas límpidas. Para concretizar esse sonho, Rodrigues da Silva propõe-se inquietar mentalidades: «Os jovens estão de costas voltadas para o rio. Se calhar porque sempre o viram poluído e sempre assistiram à morte de peixes».

Uma das estratégias usadas no combate à poluição será a sensibilização das populações. Ao nível mais técnico do Emprego, estão previstos cursos de formação, alguns dos quais já estão no terreno, em S. Romão e na Trofa. Na área do Ambiente, são organizados cursos para técnicos operadores de sistemas ambientais para tratamento das estações de águas residuais.

O Grande Esgoto

Na década de 1960, este rio foi considerado ‘O Grande Esgoto’ - uma designação pouco honrosa que ilustrava o local onde eram drenados os resíduos de 700 empresas instaladas nas suas margens, bem como águas residuais domésticas produzidas por 500 mil pessoas. No início da década de 1990, o Estado desenvolveu um ambicioso projecto de despoluição: de acordo com Rodrigues da Silva, gastaram-se cerca de 89 mil milhões de euros, e construíram-se três grandes Estações de Tratamento de Águas Residuais (ETAR).

Para José Eduardo Martins, secretário de Estado do Ambiente, é natural que ainda haja muito para fazer por este rio, pois as políticas ambientais têm uma história de apenas duas décadas.

O que corre mal...

Apesar de todos os esforços de melhoria das condições do caudal do rio, José Abílio Costa, Presidente da Junta de Freguesia de Caldas de Vizela, não acredita na despoluição do Rio Ave e seus afluentes nos próximos 10 anos. Na sua opinião, a despoluição só será sucedida com a ajuda de todos, demonstrando maior civismo.

Por seu lado, Pedro Duarte, licenciado em Ecologia Marítima e docente da Universidade Fernando Pessoa, alerta que é necessário ter em linha de conta os poluentes que ficam acumulados no leito do rio. Normalmente, o que se analisa com maior exaustão é a qualidade da água, esquecendo-se os sedimentos, a fauna, a flora e as margens do rio.

Para este ecologista, a matéria inorgânica também deveria ser removida do leito do rio, uma vez que essas substâncias são ainda mais perigosas do que os compostos orgânicos. Neste contexto, Pedro Duarte é da opinião que o rio só estará despoluído quando os sedimentos, a margem adjacente e a água estiverem limpos.

Uma questão de dinheiro

A Mundotêxtil é uma empresa do Vale do Ave que, segundo o seu representante, Ricardo Ferreira, apesar de ter tido um apoio significativo do Estado para instalar o equipamento de tratamento de poluentes, continua a precisar de efectuar investimentos avultados no sector ambiental.

Ricardo Ferreira diz que o sistema de despoluição do Vale do Ave tem funcionado com problemas e queixa-se de que os valores cobrados pelas descargas «são elevados, prevalecendo a lógica do negócio e não a efectiva preservação do ambiente». Ricardo Ferreira considera que os equipamentos têm evoluído na sua eficácia e, embora dispendiosos, são fundamentais.

Para o representante do Mundotêxtil, a fiscalização é necessária assim como o bom funcionamento das infra-estruturas: «a verdade é que o Rio Ave continua poluído apesar dos volumosos investimentos efectuados».

A importância das ETAR

Águas do Ave é a empresa que supervisiona as ETAR do rio Ave. A empresa TRATAVE - Tratamento de Águas Residuais do Ave - tem autorização para explorar as estações existentes de tratamento de águas residuais do SIDVA (Sistema Integrado de Despoluição do Vale do Ave), actualmente substituído pelo Sistema Multimunicipal de Abastecimento e Saneamento do Vale do Ave.

Este sistema integra um Plano Geral de Saneamento e um Plano Geral de Abastecimento, que tem como objectivo aumentar a capacidade de tratamento das águas.

O sistema de despoluição do Ave é constituído por três ETAR: Serzedelo, Rabada e Agra. Estas frentes de drenagem, já em pleno funcionamento, abrangem cinco dos oito concelhos previstos no Plano Geral de Saneamento (Guimarães, Santo Tirso, Famalicão, Vizela e Trofa).
O esquema de tratamento é igual nas três ETAR e, após o tratamento, as águas são devolvidas ao rio.

A ETAR de Serzedelo tem a função de drenar a água do rio, retirar os compostos orgânicos e tratá-la de modo a devolvê-la à bacia com níveis de poluição definidos na lei. Este sistema de saneamento não cuida dos compostos inorgânicos. Essa estrutura tem ainda capacidade para recolher 15 mil m3 de caudal, por dia. Contudo, está a receber 25 mil m3, para não deixar que águas poluídas sejam ejectadas directamente no rio. Esta sobrecarga é temporária e o problema está solucionado com as obras previstas para duplicar as infra-estruturas.

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