26 junho, 2004

Escolas do futuro

A chuva e o frio dentro das salas de aula deixou de ser aceitável. Aliás, para a Câmara Municipal de Matosinhos, já o deixou de ser há cerca de seis anos atrás, altura em que resolveu investir três milhões e meio de euros na renovação das escolas do primeiro ciclo daquele concelho. Os primeiros resultados estão já à vista. As consequências: crianças mais felizes no ambiente escolar.

Por: Joana Pais

Há já perto de vinte anos que as escolas primárias passaram para a competência das autarquias. Neste sentido, na década de 1980, a Câmara Municipal de Matosinhos recebeu do Ministério da Educação cerca de 47 escolas que, já na altura, apresentavam uma série de problemas, sobretudo ao nível de mobiliário e material pedagógico. Quem o diz é o actual vereador da Cultura e do Ensino da Câmara de Matosinhos, Fernando Rocha. Este ex-jornalista da RTP e da Rádio Comercial afirma que há seis anos atrás, altura em que assumiu o pelouro autárquico, entendeu que «era a altura de se fazer um plano de renovação, modernização e, em alguns casos, de ampliação das escolas do primeiro ciclo do concelho de Matosinhos».

Segundo aquele vereador, as exigências de hoje são bem maiores do que as do passado, pelo que este plano se tornou imprescindível. «No meu tempo, uma escola primária era uma edifício habitualmente frio, pouco confortável, e que tinha apenas quatro salas cercadas por um recinto de terra a que chamávamos recreio e onde colocávamos duas pedras ou duas pastas que funcionavam como balizas para jogarmos futebol». Para essa altura, a situação era aceitável, diz Fernando Rocha. «Mas entretanto, e ainda bem, o país evoluiu e as exigências passaram a ser outras». Hoje, são essenciais as cantinas, bibliotecas, os ATL’s, pré-escolares, «e outro tipo de apoios, nomeadamente, a deficientes». Por estas razões tornou-se imprescindível a realização de um plano de intervenção nas escolas do concelho de Matosinhos

«Nós temos muito orgulho, eu até tenho vaidade, naquilo que fazemos»

«Um projecto único adaptado a cada uma das circunstâncias». Esta foi a filosofia com que o projecto se iniciou. Até porque as escolas envolvidas neste plano são as chamadas «escolas do plano centenário, ou seja, escolas todas iguais, típicas». No entanto, estas intervenções coincidiram também com a entrada na Câmara de novos e jovens arquitectos. Como tal, depois de criado o programa de intervenção, «deixámos tudo à livre criatividade dos arquitectos».

E apesar da constante reacção a tudo o que é novo, e da falta de confiança no trabalho de gente jovem, o programa, que está estabelecido a oito anos, tem já 75% das intervenções cumpridas. «Eu entendi que valia a pena assumir esse risco porque sei que quando comecei a minha carreira profissional, alguém também assumiu esse risco por mim», explica Fernando Rocha.

Os resultados de hoje são o reconhecimento, pelo Ministério da Educação, do melhor parque escolar do país. O vereador diz que esse reconhecimento satisfaz os envolvidos, «não por questões do ego, mas porque ao ter um bom parque escolar se está a oferecer boas condições de acesso à educação».

A escola do futuro, nome que a autarquia deu à «revolução» do seu parque escolar, conta já com novas tecnologias fundamentais à sociedade da informação. Nesta medida, Fernando Rocha diz ser «quase risível» a promessa do Governo de colocar ligação à Internet em todas as escolas, quando já lá vão seis anos desde que Matosinhos pensou nisso. Aliás, motivos de orgulho não faltam. A Rede Nacional de Bibliotecas Escolares, projecto a que Câmara também aderiu, fornece igualmente motivos de vaidade à autarquia, pelo facto de ser «em termos relativos, e em termos absolutos, aquela que mais bibliotecas tem integradas». Existem, em Matosinhos, 21 bibliotecas escolares «com todos os equipamentos, e não apenas estantes com livros».

«Nós temos dinheiro suficiente para fazer bem as coisas»

Embora de 47 tenha passado, actualmente, a 42 escolas, a Câmara de Matosinhos teve, obviamente, de estabelecer prioridades. Fernando Rocha afirma que «todas as escolas precisavam de intervenções, umas mais, outras menos. Mas tivemos de atacar primeiro as que estavam num pior estado de degradação». Aliás, o vereador confirma ainda que «quem está na vida pública e na política sabe que tudo é uma questão de estabelecer prioridades».

Depois de três milhões e meio de euros investidos pela Câmara Municipal de Matosinhos na renovação do seu parque escolar, os resultados começam a estar à vista e a agradar aqueles que os observam. Apesar do próprio Fernando Rocha assumir que a Câmara «não está a nadar em dinheiro», a verdade é que «temos o dinheiro suficiente para fazer bem as coisas». No entanto, todo o orçamento tem de ser muito bem gerido para que todos beneficiem dele.

Nesta medida, foi estabelecido um programa concreto para cada uma das escolas, «em função das necessidades, e projectando o futuro». Não obstante, dele constam ainda três componentes transversais: «Têm de ter sempre uma cantina, um polivalente para a educação física e uma biblioteca». Quanto ao número de salas, esse «vai depender do estudo da população e da previsão da população estudantil». Relativamente ao pré-escolar a tendência é a exactamente a mesma, o número de salas a ele dedicado varia consoante os resultados da investigação feita previamente.

Mas há outras particularidades definidas antecipadamente, «nomeadamente ao nível de materiais», diz Fernando Rocha. As escolas estão equipadas com mobiliário de alta qualidade, embora o arquitecto responsável tenha a possibilidade de optar pelos materiais que entender, dentro dos limites da lei. Aliás, uma visita às escolas de Matosinhos abrangidas pelo programa prova a diversidade estética resultante da capacidade de decisão do arquitecto.

Afinal, ir para as aulas pode ser divertido

As escolas degradadas, onde chovia e não havia aquecimento, parecem outras. Além das modernizadas, alguns edifícios foram construídos a partir do zero. O casaco, agora, pode ficar à porta da sala de aula, uma vez que o aquecimento central está em funcionamento. O chão já não é de cimento, mas sim de taco. Os computadores estão ligados e os livros disponíveis na biblioteca.

«As pessoas estão habituadas àquela escola primária que é um edifício, normalmente branquinho, com uma porta de cada lado, duas janelinhas, e um recreio à volta», diz o ex-jornalista, agora vereador. As novas componentes arquitectónicas e a componente lúdica que os arquitectos tentam incutir nas instalações, são extremamente vantajosas para aqueles que frequentam as escolas.

A Escola Nogueira Pinto, situada em Leça da Palmeira, é um dos exemplos já terminados deste programa da Câmara Municipal, cuja renovação é, aos olhos da maioria, abismal. Inicialmente a escola contava apenas com um edifico que datava já dos anos 1950. Para além da chuva nas salas de aula, das casas de banho degradadas e sem os requisitos mínimos de higiene, e da água nos quadros eléctricos, a situação ia-se remediando. No entanto, ir para a escola era um autêntico martírio, quer para os alunos, quer para os próprios professores. Mas tudo mudou desde Dezembro passado, data da inauguração da escola requalificada.

Guilherme Machado Vaz foi o arquitecto que, com 700 mil euros, tornou a escola num sítio agradável de estar. Preocupado em «não perder a identidade original do edifício já existente», o arquitecto teve de arranjar espaço para construir o que faltava sem retirar recreio às 120 crianças que lá estudam. Neste sentido, foram erguidas duas novas edificações em pontos estratégicos para dar lugar a uma cantina e polivalente, a uns balneários, a novas casas de banho, incluindo uma para deficientes, a uma biblioteca, e a uma sala de professores.

Num ano e meio criaram-se ali novas infra-estruturas que todos agradecem. Por exemplo o André, da quarta classe, que era alérgico ao giz, está todo contente porque já pode ir ao quadro que não é de lousa. Para além do aquecimento central, o outro pormenor mais referido é o chão do recreio. Guilherme Vaz preocupou-se em aplicar um pavimento de borracha por emulsão que julga que «as mães vão agradecer porque vão acabar as calças rasgadas nos joelhos e, se calhar, diminuirão as cabeças rachadas». Mas as próprias crianças estão felizes com aquele chão que «não magoa», como confirma o Duarte, também da quarta classe. Contudo, o Pedro, da mesma turma, só tem pena de não poder jogar futebol porque as professoras dizem que «o chão e as paredes não são para estragar».

O António concorda com a professora Fernanda Barros ao dizer que a Escola Nogueira Pinto, agora, «tem mais espaço e mais condições para aprender». Lamenta, no entanto, assim como o Duarte Barros, só lá ficar mais um ano. Ao que parece, o vereador estava certo ao afirmar que «há muito maior probabilidade de uma criança ser feliz numa escola simpática, numa escola bonita, numa escola que lhe dê conforto»!

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